O ser humano, ao longo de sua vida, tem a capacidade de amealhar bens, direitos e obrigações; quando falece, esse conjunto de direitos e deveres, denominado herança, é transmitido aos respectivos herdeiros ou legatários, pela via da sucessão. Lembrando que, caso as dívidas sejam maiores do que os bens deixados pelo falecido, o herdeiro não é obrigado a se responsabilizar por elas, afinal, em nosso país, não se herdam dívidas. Pois bem!

De acordo com o art. 1.784 do Código Civil, aberta a sucessão, ou seja, com o óbito, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

Essa transmissão instantânea da herança decorre de princípio fundamental do Direito sucessório, denominado, princípio da saisine, cujo objetivo é impedir que o patrimônio deixado pelo de cujus fique sem titular, enquanto se processa a transferência definitiva dos bens aos sucessores.

Importante destacar que, embora a transmissão da herança ocorra logo após a morte, se faz necessário, por meio de processo de inventário, a sua transferência definitiva.

No entanto, há casos em que o herdeiro não quer receber a sua herança, ou ainda, quer deixá-la para outro, ou mesmo vendê-la antes de finalizar o processo de inventário, sendo comum nesse momento surgirem as confusões entre a cessão dos direitos hereditários e a renúncia a herança. Vamos aos esclarecimentos.

A renúncia é um ato de vontade do herdeiro que, não tendo interesse na herança, renuncia ao seu direito em benefício dos demais herdeiros. Não é possível que a renúncia alcance herdeiro específico, ou seja, ao renunciar, não é permitido determinar que a parte que caberia ao renunciante seja destinada a uma determinada pessoa, pois quem renúncia, de fato, não assume qualquer obrigação, porém, também não exerce qualquer direito.

Destaque-se que são irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança. Todavia, quando a renúncia tiver por objetivo prejudicar credores, esses poderão, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante.
Enfim, se a renúncia for aceita, o renunciante ficará livre de quaisquer direitos ou obrigações em relação a herança.
De outro lado, temos a cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil. A cessão implica necessariamente a aceitação da herança, por evidente, só é possível ceder aquilo que se tem.

Portanto, a cessão consiste na doação ou alienação da parte da herança que cabe ao cedente (quem cede), em benefício do cessionário (quem recebe), que pode ser outro herdeiro ou mesmo um terceiro. Efetivando-se a cessão, o cessionário passa a integrar o rol dos herdeiros.

Sobre a cessão de direitos hereditários, importante se faz as seguintes observações:

O cessionário, a partir da efetivação do ato, passa a exercer todos os direitos que antes cabiam ao herdeiro cedente, inclusive o direito de imissão na posse, para uso ou exploração imediata dos bens cedidos;
Não é possível ceder direitos hereditários antes do falecimento do autor da herança, o art. 426 do Código Civil proíbe que a herança de pessoa viva seja objeto de contrato.
Em regra, a cessão de direitos hereditários se faz por meio de escritura pública (art. 1793 do Código Civil), contudo, nada impede que ela seja reduzida a termo pelo Cartório do Juízo onde se processa o inventário;
Antes da partilha, a herança constitui-se em uma universalidade, não há ainda uma individualização sobre o direito de cada herdeiro, assim, não se permite a alienação de determinado bem singularmente;
A cessão opera sobre a totalidade dos direitos hereditários do cedente, ressalvados aqueles conferidos em consequência de substituição ou de direito de acrescer, pois, a época em que celebrada a cessão, referidos bens ainda não compunham o patrimônio do cedente;
É possível a obtenção de consentimento judicial, para a venda de bem singular, ainda que indivisível, caracterizando-se antecipação de partilha;
É possível a promoção de inventário extrajudicial por cessionário de direitos hereditários, mesmo na hipótese de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros estejam presentes e concordes;
Na cessão de direitos hereditários, havendo mais de um herdeiro, há o direito de preferência. Assim, antes de oferecer a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, o cedente deve, primeiramente, oferecê-lo aos coerdeiros;
A escritura de cessão de direitos hereditários não pode ser levada a registro no cartório de registro de imóveis. A finalidade dessa escritura é para que o cessionário venha a se habilitar no processo de inventário, como se herdeiro fosse;
O formal de partilha, expedido ao final do processo de inventário, conferirá ao cessionário o direito de propriedade sobre os bens adquiridos pela cessão, sendo esse o documento que será levado para registro no cartório de imóveis (Lei nº 6.015/73, art. 167, I, 25).

Enfim, esses são os principais destaques sobre a renúncia e a cessão de direitos hereditários, ressaltando que, pela importância e complexidade dos referidos atos, é imprescindível realizá-los de forma consciente, evitando orientar-se pela emoção; após o óbito, é comum a emoção tomar conta dos interessados, e assim ocorrer a prática de atitudes precipitadas, as quais culminam em enormes conflitos judiciais e familiares.